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sábado, 24 de agosto de 2013

Aqueles que sonham com um VATICANO III

2013-08-22--------- Leonardo Boff, ex-franciscano, expoente mais visível do ponto de vista midiático daquilo que resta da Teologia da Libertação, foi apenas o último em ordem de tempo a pedir um novo concílio, um Vaticano III. Ele o fez nas colunas do Jornal do Brasil, tomando como ponto de partida os 50 anos da morte de João XXIII: "Com as categorias do Concílio Vaticano II não daremos mais conta desta nova realidade". A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, 20-08-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.---------------------------------------------------------------------------------------------- Segundo Boff, deveria ser um concílio de toda a cristandade e deveria "identificar o tipo de colaboração que podemos oferecer na linha de uma nova consciência de respeito, de veneração, de cuidado de todos os ecossistemas". É curioso notar que se anseia por um Vaticano III há nada menos do que 36 anos. A ideia havia sido lançada pela primeira vez no verão europeu de 1977, quando os teólogos da revista Concilium se reuniram na Notre Dame University, nos EUA. Estavam, dentre outros, o suíço Hans Küng e o holandês Edward Schillebeeckx, os italianos Giuseppe Alberigo e Rosino Gibellini. A reunião de teólogos e historiadores progressistas fixou os objetivos do futuro concílio: renúncia do papa aos 75 anos; Sínodo dos Bispos não mais consultivo, mas deliberativo; abolição do celibato dos padres; equiparação da mulher na vida da Igreja, incluindo o sacerdócio feminino. A proposta de linhagem wojtyliana Mas se equivocaria quem pensasse que a proposta é relançada de tempos em tempos apenas pelos ambientes progressistas, intencionados a pisar no acelerador das reformas. No início dos anos 1990, surpreendentemente, a proposta foi apropriada por ambientes conservadores de provada fé wojtyliana. Quem relançou a ideia, nas colunas da revista norte-americana Catholic World Report, foi o historiador inglês Paul Johnson. Na Itália, o filósofo Rocco Buttiglione, amigo e colaborador de João Paulo II, tinha ecoado a proposta, ao fazer referência, em uma en-trevista, à preparação de «materiais para um novo grande concílio". Entre os defensores da ideia, à época, também se incluía o bispo austríaco ultraconser-vador Kurt Krenn. O Vaticano III ansiado pelos wojtylianos mais ortodoxos era, nas in-tenções, o oposto daquele pedido por Küng em 1977. Na realidade, desejava-se um concílio restaurador que colocasse novamente em linhas os progressistas e os indisciplinados e freasse a tentativa de algumas conferências episcopais de se atribuir poderes e competências. Em suma, para os defensores do Vaticano III de estilo "lei e ordem", a Igreja Católica, apesar da guinada de João Paulo II, ainda vivia uma época de laxismo e de confusão doutrinais. Mas as aspirações dos conservadores conciliaristas foram acolhidas muito friamente no Vaticano. O cardeal Joseph Ratzinger rotulou a ideia como "absolutamente prematura". O então prefeito do ex-Santo Ofício e futuro papa, em uma entrevista de 1992, tinha es-friado as expectativas desta forma: "Eu não acho que seja o momento. Seria absoluta-mente prematuro. Porque o concílio é sempre um grande compromisso, que bloqueia por um certo período a vida normal da Igreja. E não se pode fazer isso com muita frequência. São Basílio, diante do convite de participar de outro Concílio de Constantinopla, disse: 'Não, não irei. Porque esses concílios só criam confusão'". A proposta martiniana Quem falou novamente sobre isso, desta vez novamente do fronte reformista, foi, em 1999, durante um Sínodo, o cardeal Carlo Maria Martini, do qual lembramos, em alguns dias, o primeiro aniversário de morte. O arcebispo de Milão apresentou o seu pedido sob a forma de "sonho", desejando "uma experiência de debate universal entre os bispos que valha para desfazer" alguns nós doutrinais e disciplinares da Igreja. Martini pedia "um instrumento colegial mais universal e com autoridade", que envolvesse "todos os bispos" em um "debate colegial", que repetisse "aquela experiência de comu-nhão e de colegialidade que os seus antecessores realizaram no Vaticano II". Uma assembleia onde pudessem ser abordados "com liberdade" problemas como a falta de sacerdotes, a posição da mulher na Igreja, os ministérios, a sexualidade, a disciplina do matrimônio, a prática penitencial, as relações ecumênicas. A proposta martiniana foi abandonada, até porque João Paulo II já tinha dito um ano antes, por ocasião do consis-tório de fevereiro de 1998, que "o Vaticano II ainda esperara chegar ao seu verão pleno". Quando o cardeal Martini fez a sua proposta, ainda faltavam seis anos para a eleição de Bento XVI e para o seu discurso à Cúria Romana em dezembro de 2005, quando o novo papa propôs aquela que ele considerava a hermenêutica correta "da reforma na continui-dade" para ler o Vaticano II, em oposição às hermenêuticas da "ruptura". Bento XVI criticava sobretudo as leituras progressistas que atribuíam ao Concílio o que o Concílio não tinha dito, mas também esperava suavizar a leitura lefebvriana em vista de uma reconciliação com a Fraternidade São Pio X. O debate que se seguiu acabou acentuando, no entanto, as polarizações. E assim, hoje, diante de Boff que pede um Vaticano III para ir além do Vaticano II, há à direita grupos que consideram o último Concílio inconciliável com a tradição católica. Enquanto isso, para além dos anúncios, das polêmicas e dos vetos cruzados, existem documentos do Vaticano II – concílio, vale a pena lembrar, que viu os seus textos apro-vados praticamente por unanimidade – ainda à espera da plena implementação: um exemplo dentre todos é o decreto Apostolicam actuositatem, sobre o papel dos leigos. Tema que continua sendo difícil em tempos de clericalismo ressurgente. Aquele clerica-lismo que o Papa Francisco considera como um dos problemas da Igreja de hoje. http://www.ihu.unisinos.br/noticias/522955-aqueles-que-sonham-com-um-vaticano-iii

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