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segunda-feira, 5 de setembro de 2011

DOM ROMERO, O ´CASO JESUÍTA´ E A ESPERANÇA

JON SOBRINO - El Salvador
Teólogo
Adital - 02\09\2011
Tradução: ADITAL

No dia 15 de agosto, Dom Romero teria cumprido 94 anos e seu aniversário coincide com o alvoroço ocasionado pelo "caso jesuítas”. Nessa Carta às Igrejas, publicamos o pronunciamento da UCA, cuja leitura se enriquece com as reflexões do Pe. Rodolfo Cardenal e Benjamín Cuéllar.

Agora, recordamos a Dom Romero para situar-nos em meio a esse alvoroço e atuar da melhor maneira possível.

Dom Romero continua oferecendo impulsos lúcidos e vigorosos para caminhar rumo à verdade; praticar a justiça e ter esperança. São impulsos muito úteis para enfrentar o caso jesuítas e, sobretudo, para sanar a lamentável situação em que vivemos.

1. As feridas estão abertas; não fechadas

O assassinato dos jesuítas, de Julia Elba e Celina é um símbolo de inumeráveis assassinatos ocorridos nos anos setenta e oitenta. Em 1981 começou uma guerra cruel entre dois exércitos. Porém, antes, nos anos 70, aconteceu uma repressão impiedosa e unilateral contra o povo por parte da oligarquia, de governos, de corpos de segurança e esquadrões da morte – e não podemos esquecer disso. Praticamente, tudo continua sem julgamento. Os Acordos de Paz foram necessários para por fim à guerra; porém, não houve decisão e nem tempo para enfrentar o problema na sua raiz: a injustiça de séculos, estrutural. A anistia também foi necessária para possibilitar um mínimo de convivência; porém, foi precipitada no tempo e, sobretudo, em seu enfoque: não foram buscados, seriamente, caminhos de reconciliação entre seres humanos. Tampouco facilitou uma reparação eficaz para que os familiares das vítimas, em sua imensa maioria compostos de gente pobre, do povo, pudesse refazer suas vidas. E não fez desaparecer, mas reforçou, a cultura de impunidade. Durante séculos, os poderosos têm sido praticamente intocáveis. E isso continua sendo verdade.

O Noivo Testamento diz que "a raiz de todos os males é a ambição pelo dinheiro”. Hoje, junto a essa ambição, em El Salvador, insistimos que "a impunidade” é a raiz principal da violência, da injustiça, da mentira e da corrupção. E temos que insistir na responsabilidade específica da Corte Suprema de Justiça. Fazemos isso a partir de Dom Romero.

Não houve pacificação e não há paz

O conflito bélico acabou; porém, não a violência massiva. Impera o homicídio. Há anos, são cometidos de 10 a 12 crimes por dia. Segundo notícias da imprensa, no mês de julho de 2011 houve 70 homicídios a mais do que em julho de 2010; só em 2011 já foram assassinados 93 estudantes; há uma semana se podia ler: "grande crescimento de homicídios”; hoje se pode ler: "40 assassinados em 36 horas”. Para maior informação e análise, remetemos ao artigo de Benjamín Cuéllar.

Há avanços em projetos concretos de benefício social e há tentativas de frear a violência; porém, é maior a incapacidade, a incompetência –às vezes, a convivência- para colocar um ponto final nisso. E em nada facilita a tarefa uma velha tradição: nenhum dos poderes públicos leva a sério a violência e a impunidade.

Além disso, em seu conjunto, apesar das exceções, os partidos, os MCS, a empresa privada, os bancos, não morrem –para usar uma expressão suave- para erradicar a violência e os homicídios. E temos que perguntar-nos também se outras forças sociais significativas se importam, tais como universidades e, inclusive, igrejas, que tanto têm proliferado, apesar de que, normalmente, seu pecado seja a omissão.

Aduzir que o julgamento dos militares pode trazer riscos ao processo de pacificação é mentira manifesta, pois não existe tal paz. O que temos que praticar é a honradez com o real. Por essa razão, começamos com uma citação de Dom Romero: "Os assassinatos, as torturas, golpear e atirar ao mar. Isso é o império do inferno” (1 de julho de 1979).

A pax romana, a eirene grega, o shalom da Bíblia

Além da denúncia da violência atual, necessitamos um mínimo de análise do que se entende por "paz” para que, definitivamente, a palavra não seja usada para não enfrentar outras realidades mais primigênias: a justiça e a injustiça.

Vejamos isso a partir da visão e da convicção de Dom Romero:

No Natal, cantamos "paz na terra aos homens de boa vontade”. O evangelista Lucas escrevia em grego e para falar de "paz”, elegeu a palavra eirene, que significa ausência de violência e de guerra. Hoje, em sentido literal, em El Salvador já não há violência bélica; porém, em absoluto existe a eirene grega. Há homicídios aos milhares.

Um passo mais. São Lucas usou a palavra eirene; porém, ao falar de "paz”, o que tinha em mente era o shalom da Bíblia: a vida em comum dos seres humanos, baseada na justiça e na verdade, na solidariedade e na reconciliação. E nela os pobres e as vítimas chegam a ter, de verdade, carta de cidadania. E nela a paz frutifica em fraternidade e gozo. Isaias disse isso em uma fórmula densa: "a paz é fruto da justiça”, e o Papa Paulo VI insistiu muito nisso. Dom Romero disse o mesmo na homilia do dia 31 de dezembro de 1977: "uma paz que se constrói na justiça, no amor e na bondade”. O Salmo o formula de maneira bela: "a paz e a justiça se beijam”.

A paz shalom, certamente, não existe no país; e sem tê-la presente e trabalhar por ela seria simplismo invocar a paz como o que salvar acima de tudo, como costuma acontecer, em nome de interesses em âmbitos políticos e, às vezes, ingenuamente, em âmbitos eclesiásticos. Não devemos cair no absurdo do antigo adágio "fiat iustitia et pereat mundus”, "que se faça justiça, mesmo que o mundo acabe” –lema de Fernando I, de Augsburg, imperador do Sacro Império Romano Germânico, no século XVI. Porém, sem shalom não há paz duradoura, nem digna dos seres humanos. Com o shalom, a justiça não fará com que o mundo acabe; pelo contrário, o mundo se humanizará. Sem o shalom, a anistia não produz bens; mas somente encobre males. Dom Romero viu isso com lucidez, mesmo que o propusesse não a partir da perspectiva de uma anistia após a guerra, que se fala hoje, mas do diálogo para colocar fim, que era o que se falava naquele tempo.

"porém, nem sequer esse diálogo servirá para restabelecer a paz desejada se não houver a firme vontade de transformar as estruturas injustas da sociedade. Somente essa transformação será capaz de eliminar as violências concretas, opressoras, repressoras ou espontâneas. De outra maneira, como disseram os bispos latino-americanos, a violência se institucionaliza e, por isso, seus frutos não se fazem esperar. A Igreja crê na paz; porém, sabe muito bem que a paz não é nem a ausência de violência, e nem pode ser alcançada com violência repressiva. A verdadeira paz só se alcança como fruto da justiça” (Homilia de 1º de abril de 1978). Não à pax romana e não à eirene grega absolutizada. O de Dom Romero foi o shalom, a paz que aponta à "transformação das estruturas injustas”.

Mas, no país, o que sabemos é sobre a pax romana, a submissão impotente e resignada que impunha o império romano a povos inteiros e que sempre é imposta pelos impérios, militares e econômicos, ao longo da história. Imperou em El Salvador, por certo até que os camponeses, com os estudantes, operários, sacerdotes... criaram consciência e se organizaram. Dom Romero entendeu bem isso e se alegrou. Mesmo com ambiquidades, perigos e pecados, viu que maior era sua necessidade e seu potencial de construir shalom. Como crente, escreveu que o crescimento das organizações populares "era um sinal dos tempos”, lugar da vontade e dos planos de Deus.

Por tudo, os que agora repetem "paz, paz, paz” deveriam perguntar-se se não recai sobre eles, de alguma forma, a recriminação de Jeremias: "Não se fiem em palavras enganosas dizendo ‘Templo de Jerusalém', ‘Templo de Jerusalém', ‘Templo de Jerusalém'... Se realmente fazem justiça, não oprimem ao estrangeiro e à viúva, e não derramam sangue inocente nesse lugar, eu ficarei com vocês” (Jer 7, 3-7). De outro modo, invocar o Templo –ou a paz- é autoenganar-se.

Outras formas de violência atual. Fome e emigração

A partir da assinatura dos Acordos de Paz, aumentou a emigração. E isso configura a realidade do país e da economia. Atinge a família, às vezes até dissolvê-la ou destroçá-la. E para muitos se converte, tristemente, em sua única esperança, tábua a que se agarram para não afundar, sobretudo os jovens. O capital, sem misericórdia, continua avassalando às maiorias e produz pobreza, "morte lenta” como era chamada antigamente. Não põe fim à desnutrição, nem à fome, e os pobres não encontram mais solução do que ir embora. Em si mesma, a emigração está cheia de crueldades.

Dom Romero denunciaria isso. E hoje denunciaria com grande força e repetidamente a fome na Somália, aos seus responsáveis diretos e à chamada comunidade internacional. Não há vontade política, isto é, não há vontade humana, não há vontade de eliminar a fome. Mais do que números e palavras, produzem horror as fotografias de crianças desnutridas e moribundas e de suas mães desesperadas ou impávidas; sem energia sequer para a queixa e o protesto. A fome tem cobrado a vida de dezenas de milhares de crianças e outras dezenas de milhares estão em iminente risco de morte. Andrew Edwards, porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os refugiados, proíbe até um otimismo moderado: "Não cometamos o erro de crer que o pior já passou. Essa crise continua com deslocamentos massivos; risco de propagação de enfermidades; pessoas amontoadas nos acampamentos e situações que superam os trabalhadores humanitários que estão trabalhando”. Na hora da verdade, a Somália desaparece. Esteve presente no centro das discussões em Madri? Hoje, o padre Ignacio Ellacuría falaria da Somália e repetiria suas conhecidas metáforas. A Somália é como um espelho invertido, no qual o primeiro mundo se vê em sua verdade. São as fezes que aparecem na coproanálise desse primeiro mundo.

Outras feridas sem fechar

A desídia de muitas instituições para deter a morte rápida da violência e da morte lenta da fome, sejam quais forem as moas intenções de indivíduos.
A cegueira ante o evidente, promovida pelos poderosos em conivência com os meios de comunicação, com notáveis exceções, às vezes audazes.
A tergiversação iníqua de que são objeto as vítimas. Nos 60 e 70 eram chamados de terroristas, ou cúmplices de terroristas, aos camponeses inocentes e indefesos dos massacres de Sumpul e de Mozote. De Dom Romero se disse que "havia vendido sua alma ao diabo”. Até houve bispo que diante de João Paulo II disse que Dom Romero –após estar morte, inocente e indefensamente- havia sido responsável por 70.000 mortos. Nesses dias do "caso jesuítas”, recordemos que em vida foram acusados de ser responsáveis pelo terrorismo. E os que, segundo sérios indícios e testemunhas, foram seus vitimários, hoje se fazem passar por vítimas.
O desprezo aos familiares das vítimas e a zombaria de sua dor. Os familiares continuam exigindo que os militares sejam julgados. O fazem juntamente com milhares de nomes de vítimas no Monumento à Memória Histórica, no Parque Cuscatlán, com a legenda Verdad, Justicia, Reparación. Também familiares dos militares acusados protestaram diante da embaixada espanhola. Sofrem e estão em seu direito de protestar. Porém, não sofrem o desprezo que os pobres sofrem.
E a inutilidade de dizer a verdade e argumentar com ela, como mostram os artigos anteriores.

2. Dom Romero: a denúncia a partir do povo crucificado

"Este é o povo crucificado”

A um povo assim oprimido, reprimido e desprezado, Dom Romero chamou "o divino traspassado”. E Ignacio Ellacuría, sem vacilar, nem discernir, afirmou que "esse povo crucificado é o sinal dos tempos”. Para ambos, era a presença do servo de Jahvé, do Filho de Deus. E nele irrompe Deus. A conclusão foi "baixá-lo da cruz”; carregarmos o peso desse povo crucificado. E segundo a loucura cristã, deixar que ele nos carregue e receber dele salvação.

Sem cair em masoquismos; porém, menos em autoengano. Ellacuría insistiu escandalosamente em que o povo crucificado é "sempre” o sinal dos tempos. Antes e depois dos Acordos de Paz, as maiorias vivem em transe de cruz. Hoje, existem outros problemas no país e houve alguns avanços e boas ideias em política social. Porém, é pouco em comparação com o que vimos. O povo continua oprimido, maltratado e ferido. Sem olhá-lo cara a cara não se pode conhecer a realidade de nosso mundo, nem crer no Deus que se faz presente nele.

As raízes dessas cruzes

Dom Romero denunciou; porém, é importante recalcar que também analisou as raízes dessas cruzes e começou pela riqueza. "Eu denuncio, sobretudo, a absolutização da riqueza; esse é o grande mal de El Salvador: a riqueza, a propriedade privada, como absoluto intocável”. É raiz de muitos males: "Ai do que toque esse arame de alta tensão! Se queima” (12 de agosto de 1979). E é princípio de degradação social: "roubar se torna comum; e o que não rouba é chamado de bobo” (18 de março de 1979). Denunciou a falsidade: estamos em um "mundo de mentiras”, e a degradação que produz: "ninguém acredita em nada” (18 de março de 1979). Denunciou o desprezo ao povo: "se joga com os povos; se joga com as votações; se joga com a dignidade das pessoas” (11 de março de 1979). Visto tudo em seu conjunto, sentenciou: "é triste a situação” (24 de junho de 1979). "Isso é o império do inferno”.

O pathos –paixão com lucidez e liberdade- de Dom Romero ao analisar a realidade continua sendo necessário. Não é fácil que apareça outro Dom Romero; porém, temos que chorar sua perda e não pactuar com sua ausência e não instalar-se no considerado política ou eclesiasticamente correto. Temos que ir à raiz; e, por isso, o pathus de Dom Romero foi poderoso. Denunciou o exército corrupto em todos os âmbitos da sociedade; porém, o fez sempre no contexto fundamental que, como cristão, o expressou a partir de Deus: "O sangue, a morte tocam o coração do próprio Deus” (16 de março de 1980). É a abominação radical.

A Corte Suprema de Justiça

Muito do que dissemos voltou à tona a propósito do "caso jesuítas”. E pela natureza do assunto, também o problema da administração da justiça. Nesse contexto, recordemos duas coisas de Dom Romero:

A primeira é que a administração da justiça com frequência não tem nada, ou quase nada de imparcial, como a mulher de olhos vendados. Em nosso país –e em outros- costuma ter os olhos abertos para favorecer a ricos e poderosos. Dom Romero disse isso com uma frase genial, escutada de um camponês: "A lei é como uma serpente. Pica somente quem está descalço”. A lei, sua administração e seu funcionamento, devido a condicionamentos materiais e históricos –não somente à debilidade ética, frequente nas pessoas- não somente não são imparciais, como também historicamente são parciais a favor do poderoso e contra o pobre- em alguns lugares mais e em outros menos. E acontece como por necessidade, pois esse tipo de parcialidade tem chagado a converter-se em uma espécie de segunda natureza, um existencial histórico que configura a administração da justiça.

Dom Romero condenou essa parcialidade a favor do poderoso; porém, não exigiu somente imparcialidade; mas abarcadora e mais divina. "Deus está diretamente a favor do pobre”. Essa parcialidade transcendente deve configurar todo o histórico dos humanos, o saber, o esperar, o fazer e o celebrar. Por difícil que pareça –inclusive, absurdo-, o "espírito” dessa parcialidade deve impregnar a "letra” da lei e sua administração. Assim, penso eu, via Dom Romero, a administração da justiça, tal como surgiu no antigo Israel. "O rei justo esperado é o que fará justiça ao pobre. Sem esse rei parcial os pobres serão mais facilmente vítimas dos poderosos”.

A segunda é sobre a Corte Suprema de Justiça. Nos últimos meses, a Sala do Constitucional gerou esperanças de uma atuação autônoma e justa, ao declarar anticonstitucionais diversas atuações de particulares, da Assembleia e do Executivo. Porém, as esperanças se esfumaram com o Decreto 743, aprovado pela Assembleia e sancionado pelo presidente do Executivo.

Apesar de que a situação não é a mesma, muito podemos aprender com Dom Romero. No dia 30 de abril de 1978, falou clara e fortemente contra a Corte Suprema de Justiça. Domingos antes, havia denunciado na homilia que "há juízes que se vendem” – de fato, abundavam. A Corte Suprema, hipocritamente, lhe pediu que ele lhes dissesse os nomes de ditos "juízes venais”. Na homilia, Dom Romero respondeu com uma precisão legal: ele não havia falado de "juízes venais”, mas de "juízes que se vendem”, e agregou que não era responsabilidade sua, mas da Corte, averiguar quem eram ditos juízes. Porém, se concentrou no fundamental, o que em boa medida é válido até hoje.

"O que faz a Corte Suprema de Justiça? Onde está o papel transcendental em uma democracia desse poder que devia estar acima de todos os poderes e reclamar justiça a todo o que a atropela? Creio que grande parte do mal estar de nossa pátria tem lá sua chave principal, no presidente e em todos os colaboradores da Corte Suprema de Justiça que, com mais inteireza, deveriam exigir às Câmaras, aos Juizados, aos juízes, a todos os administradores dessa palavra sacrossanta, a justiça, que, de verdade, sejam agentes de justiça”.

Com a Constituição em mãos, enumerou os direitos desrespeitados. E concluiu:

"Essa Honorável Corte não remediou essas situações, tão contrárias às liberdades públicas e aos direitos humanos, cuja defesa constitui sua mais alta missão. Temos, pois, que os direitos fundamentais do homem salvadorenho são pisoteados dia a dia, sem que nenhuma instituição denuncie os atropelos e proceda sincera e efetivamente a um saneamento”.

Hoje, denunciaria homicídios, desnutrição, fome. E recriminaria à Corte Suprema de Justiça que muitas vítimas e seus familiares têm que tragar sua dor sem ser sequer ouvidos. Nesses dias, muitos juízes tiveram a total convicção de que não haverá extradição dos militares acusados no caso jesuítas. E essa convicção não está baseada em argumentos, mas em um a priori: têm muito poder. E, assim, tem acontecido. E pensamos que a hierarquia não deveria aderir precipitamente aos ditames da Corte, tantas vezes turvos. E custa acreditar que o bispo castrense tenha celebrado na escola militar uma missa em ação de graças porque os militares não foram extraditados.

3. Dom Romero crente: Deus e esperança

Não se pode ir ao fundo de Dom Romero sem ter presente ao seu Deus e como seu mistério nos humaniza. Basta citar essas palavras que pronunciou seis semanas antes de ser assassinado, em meio à tragédia do país:

"Nenhum homem se conhece enquanto não tenha se encontrado com Deus... Quem me dera, queridos irmãos, que o fruto dessa predicação fosse o nosso encontro com Deus e que vivêssemos a alegria de sua majestade e de nossa pequenez!” (10 de fevereiro de 1980).

A partir dessa experiência de Deus, Dom Romero pode falar com absoluta convicção de coisas que não se costuma falar muito e que, no entanto, são centrais ao redor do caso dos jesuítas: a conversão, o perdão, o deixar-se perdoar, as vítimas e mártires... E pode falar de esperança, coisa que, em geral, ninguém faz hoje; nem a sociedade, nem a Igreja; nem em El Salvador, nem no Vaticano. Mas, Dom Romero o fez. "Regressarão os desaparecidos. O sangue derramado não terá sido em vão”. Pensando nos sofrimentos de nossos dias, recordemos essas palavras suas.

"E haverá uma hora em que já não haverá sequestros e haverá felicidade e poderemos sair às nossas ruas e aos nossos campos sem medo de que nos torturem e nos sequestrem. Virá esse tempo!... Para mim, essa é a maior honra da missão que o Senhor me confiou: estar mantendo essa esperança e essa fé no povo de Deus (Homilia de 2 de setembro de 1979).

Dom Romero anunciou a esperança e suas palavras somente podem vir do alto: "Sobre essas ruínas brilhará a glória do Senhor” (7 de janeiro de 1979). E se alguém pergunta que é essa glória do Senhor, Dom Romero lhe responde: "A glória de Deus é a vida do pobre”. "Gloria Dei vivens pauper”.

29 de agosto, 2011.

[NdE: Más información sobre:
- Dom Óscar Arnulfo Romero: http://www.comitesromero.org/romero.htm
- Ignacio Ellacuría: http://www.ensayistas.org/filosofos/spain/ellacuria/ ]

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