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quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Alberigo o Concílio dentro da história

O jornal Corriere della Sera, 05-05-2009, publicou uma síntese do prefácio escrito pelo cardeal alemão Karl Lehmann, bispo de Mainz, para o livro "Transizione epocale. Studi sul Concilio Vaticano II" [Transição epocal. Estudos sobre o Concílio Vaticano II, em tradução livre] (Editora Il Mulino), que recolhe os ensaios de pesquisas dedicadas pelo historiador Giuseppe Alberigo (1926-2007) aos fatos e às deliberações conciliares. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.
Giuseppe Alberigo chegou aos estudos sobre o Concílio de dentro do Vaticano II em uma posição totalmente particular: com o seu mestre Hubert Jedin e alguns outros, foi um dos poucos especialistas presentes em Roma entre 1962 e 1965 que tinham um conhecimento efetivo do desenvolvimento histórico dos concílios e da sua peculiaridade na história da Igreja. Alberigo seguiu e defendeu, com opiniões, memórias, apontamentos, a atividade do cardeal de Bolonha e moderador do Concílio, Giacomo Lercaro. Sobretudo, participou daquele fermento de pensamento sobre o qual o Concílio apoiou a sua intensa atividade e a profundidade da atualização. E ele teve também um papel específico na difícil discussão sobre a colegialidade episcopal.
Porém, além de viver o Concílio, Alberigo se tornou rapidamente um estudioso desse evento, que se dedicou à edição de um instrumento cujo valor fica claro ao folhear as imitações que o seguiram: a "Synopsis historica" da constituição "Lumen Gentium", de fato, não é só um trabalho de excelente fineza filológica que alinha as versões do "De Ecclesia succedutesi" da preparação do documento à sua votação final em 1964. Ela fornece, além disso, as pegadas de um modo de pensar o Concílio e fornece aquele princípio histórico e hermenêutico que se coloca em toda a sua originalidade na discussão sobre a aplicação, recepção, superação e rejeição do Concílio, tão clara naquele momento (1973).
Turbulenta como a recepção de todo grande concílio, a fase pós-Vaticano II também via as atitudes de desvalorização do Concílio de todo o tipo sobreporem-se: uma banalização "aplicativa" que esmiuçava o concílio em "loghia", um medo intimidante diante da prepotência do despertar da vida cristã, uma rejeição arrogante do que a ação do Espírito na Igreja vinha suscitando, um desprezo pela cansativa pesquisa de fidelidade ao Evangelho em nome de preferências teológicas excêntricas.
A sua resposta de estudioso amadureceu em torno do sínodo de 1985, por ocasião do qual emergiu claramente a distância entre uma fidelidade nominalista ao Concílio e a fidelidade ao evento de graça do qual os bispos, junto com João Paulo II, confessaram posteriormente o caráter de novo Pentecostes que o Papa João XIII havia sonhado. Nasce, pouco depois daquele sínodo ao qual Alberigo havia dedicado um dos fascículos da [revista] Concilium, editada por ele, o projeto de uma história do Vaticano II: o projeto de uma aquisição do Concílio à história.
Porque o Vaticano II, como todo grande concílio, chegou a produzir certamente um decreto cujos gêneros literários são variados: mas o processo que levou a esses atos não foi uma banal estrutura sob a qual se construiu o edifício da decisão, mas foi ele mesmo ato e história, e é disso que o historiador deve se ocupar. O evento conciliar, enfim, não se coloca em uma posição preliminar e subalterna, mas entra na área de interesse do historiador: e é sobre isso que se baseia toda hermenêutica do texto, que não só encontra, no processo redacional, pistas necessárias para uma interpretação autêntica, mas sobretudo encontra nessa epifania de comunhão e de catolicidade que é o Concílio o próprio estatuto e os próprios antídotos contra os sofismas astutos e as manipulações involuntárias.
Essa articulação entre evento e decisão, portanto, constitui talvez a maior contribuição que Alberigo deixou para a história, para a história da Igreja e também da Igreja católica: contribuição que justamente continua sendo inacessível a quem não tenha um marcado sentido histórico e imagine a colocação da Igreja na história como um detalhe mudo. Um docetismo eclesiológico como esse era estranho a Alberigo, justamente porque a sua ideia sobre o fato de que o cristianismo é feito de história encontrava, em muitos momentos do percurso da Igreja no tempo e de modo particular na história dos concílios, os próprios fundamentos críticos.
Assim, enquanto os aniversários se sucedem, os comentários assumem um o lugar do outro, e uma nova edição crítica afina o conhecimento do texto, o Concílio continua lá: interrogando e iluminando a Igreja, a teologia, a história. Outros concílios, não menos vibrantes e decisivos, tinham que se contentar com uma historiografia polêmica ou deviam ser medidos com hermenêuticas denigratórias muito pesadas. O fato de que o Vaticano II tenha tido à disposição um historiador do valor de Alberigo faz parte da história desse Concílio, mas também do futuro da Igreja.
Para ler mais:
• Giuseppe Alberigo, historiador do Vaticano II
• A Bíblia critica a Igreja, segundo Karl Lehmann
• 'Ratzinger deveria fazer um Concílio Vaticano III', afirma Zizola
• ‘Os católicos alemães esperam uma valorização do Concílio Vaticano II’
• Quem ainda tem medo do Concílio?
• Sínodo dos Bispos atualizou o Concílio Vaticano II. Entrevista especial com Johan Konings

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