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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

O Vaticano II 50 anos depois

José Comblin
(+ 27-03-2011)


O Concílio Vaticano II permanecerá na história como uma tentativa de reformar a Igreja no final de uma época história de 15 séculos. Seu único defeito foi que chegou demasiado tarde. Três anos após sua conclusão, tinha início a maior revolução cultural do Ocidente.
A análise é do teólogo José Comblin, falecido em março deste ano, em artigo publicado na revista Adista Documenti, nº. 68, 24-09-2011. A tradução é de Benno Dischinger.

Eis o texto.

O Vaticano II, 50 anos depois
1. Antes do Concílio
A maioria dos bispos que chegou ao Concílio Vaticano II não entendia porque tinha sido convocada. Os bispos, como os funcionários da Cúria, pensavam que o papa sozinho pudesse decidir tudo e que não fosse necessário convocar um Concílio. Mas, havia uma minoria profundamente consciente dos problemas existentes no povo católico, sobretudo nos países intelectual e pastoralmente mais desenvolvidos, onde se havia vivenciado episódios dramáticos de contraposição entre as preocupações dos sacerdotes mais abertos ao mundo contemporâneo e a administração vaticana. Todos aqueles que procuravam uma presença da Igreja no mundo contemporâneo, marcado pelo desenvolvimento das ciências, da tecnologia e da nova economia, como também pelo espírito democrático, eram reprimidos. Havia, no entanto, uma elite de bispos e cardeais cônscios das reformas necessárias e decididos a acolher a ocasião oferecida por João XXIII.
As comissões preparatórias eram claramente conservadoras e é por isso que, na abertura do Concílio, as perspectivas dos teólogos e dos peritos trazidos pelos bispos mais conscientes eram antes pessimistas. Mas, houve o discurso de abertura de João XXIII, que rompia decididamente com a tradição dos papas anteriores. João XXIII anunciou que o Concílio não se reunira para pronunciar novas condenações de heresias, como de costume. Tratava-se de apresentar ao mundo outra imagem de Igreja que a tornasse mais compreensível aos contemporâneos. A maior parte dos bispos não compreendeu nada e pensou que o papa não tivesse dito nada, porque não havia mencionado nenhuma heresia. Para o papa não se tratava de aumentar o número dos dogmas, mas de falar a mundo moderno numa linguagem que este pudesse compreender. Uma minoria iluminada entendeu a mensagem e sentiu ter obtido o apoio do papa na luta contra a Cúria.
Mas, a Cúria romana tinha uma estratégia. Existia um modo de anular o Concílio. As comissões preparatórias haviam preparado documentos sobre todas as questões anunciadas: Todos estes documentos eram conservadores e não permitiam nenhuma mudança real na pastoral. Teriam sido consignados às comissões conciliares que os teriam aprovado e o Concílio teria terminado em poucas semanas com documentos inofensivos que não teriam modificado nada. O importante eram traçar listas de comissões com bispos conservadores e explicar ao Concílio que a coisa mais prática era aceitar as listas já preparadas pela Cúria.
O primeiro a descobrir tal estratégia foi dom Manuel Larrain, bispo de Talca, no Chile, e presidente da Celam. Junto com dom Helder Câmara – eram amigos íntimos, habituados a trabalhar juntos – foram avisar os líderes do episcopado reformador. (...) Tratava-se de rejeitar as listas preparadas pela Cúria e solicitar que as comissões fossem eleitas pelo próprio Concílio. O cardeal Döpfner de Munique, Liénart de Lille, Sünens de Malinas, Montini de Milão e alguns outros tomaram a palavra e solicitaram que fosse o próprio Concílio que nomeasse os membros das comissões, proposta que foi aprovada por aclamação.
A conclusão foi que as novas comissões rejeitaram todos os documentos elaborados pelas comissões preparatórias: uma afirmação do episcopado referente à Cúria romana. O papa ficou satisfeito. (...).
A maioria conciliar que o grupo líder conseguiu garantir não queria uma ruptura e por isso sempre deu importância à minoria conservadora, embora pequena, que representava os interesses da Cúria e se identificava com ela. Portanto, muitos textos resultaram ambíguos, porque a um parágrafo reformista seguia um conservador que dizia o contrário. De um lado se anunciavam novos temas e do outro se dava espaço àqueles velhos da tradição dos papas Pio. Tal ambiguidade prejudicou muito a aplicação do Concílio.
A minoria conciliar e a Cúria não se converteram. Ainda hoje se opõem ao Vaticano II, encontrando argumentos nos próprios textos conciliares conservadores. Quando João Paulo II citava os textos do Vaticano II, eram aqueles mais conservadores, como se os outros não existissem. Por exemplo, na Constituição Lúmen Gentium, é claro que o acento é posto sobre o papel dado ao povo de Deus. Todavia, quando se trata da hierarquia, o povo de Deus desaparece e tudo continua como sempre. Em 1985, por solicitação do cardeal Ratzinger, o termo povo de Deus foi eliminado do vocabulário do Vaticano. Desde então, nenhum documento romano faz referência ao povo de Deus, que era o tema central da Constituição conciliar. (...)
Tal situação teve muita importância na evolução subsequente do Vaticano II na Igreja. Desde o início, houve um partido ao qual sempre se deu importância e poder e que lutou contra todas as novidades. Nas eleições pontifícias que, como sempre, são manipuladas por alguns grupos, o problema do Vaticano II tem sido decisivo e tem sido eleitos papas dos quais se conheciam as reservas sobre os documentos conciliares em tudo o que tinham de novo. O atual papa ainda pode viver dez anos e mais. Depois dele podemos prever que seja novamente eleito um papa pouco empenhado com o Concílio, para usar um eufemismo, porque os grupos que sustentam esta posição são muito fortes na Cúria e no colégio dos cardeais, e não há sinais que as futuras nomeações possam produzir uma mudança de direção. As últimas nomeações na Cúria são eloquentes.
2. De 1965 a 1968
A história da recepção do Vaticano II foi determinada por um acontecimento totalmente imprevisto. 1968 é a data símbolo da maior revolução cultural na história do Ocidente, mais do que a revolução francesa ou a russa, porque atinge a totalidade dos valores da vida e todas as estruturas sociais. A partir de 1968 houve muito mais do que um protesto estudantil. Houve o início de um novo sistema de valores e de uma nova interpretação da vida humana.
O Vaticano II respondera às interrogações e aos desafios da sociedade ocidental em 1962. (...). A sociedade européia destruída pela guerra tinha sido reconstruída e a Igreja ocupava um lugar relevante na sociedade. (...). Na realidade, perdera contato com a classe operária, mas esta já estava se reduzindo numericamente por via da evolução da economia para os serviços. O número dos católicos praticantes estava diminuindo, mas não de modo a chamar a atenção. (...). Os problemas eram estruturais e não tocavam os dogmas nem a moral tradicional.
Em 1968 entrava improvisamente em andamento uma revolução total que abraçava todos os dogmas e toda a moral tradicional, bem como todas as estruturas institucionais da Igreja e de toda a sociedade. (...). O Vaticano II respondera aos problemas de 1962, mas nada tinha a responder aos desafios de 1968. Em 1968 teria sido um Concílio conservador apavorado pelas radicais transformações culturais que tinham início.
(...). 1968 significa uma mudança de toda a política, da educação, dos valores morais, da organização da vida e da economia. (...).
a) 1968 significou uma crítica radical perante todas as instituições estáveis e de todos os sistemas de autoridade. Era a contestação global de toda a sociedade organizada tradicional. (...). A Igreja católica era o modelo típico de um sistema institucional radicalmente autoritário. Por isso, foi imediata e vigorosamente atacada e denunciada. As mudanças conciliares, tão tímidas, não podiam convencer a nova geração. O Vaticano II era totalmente inofensivo se confrontado com a revolução cultural iniciada em 1968.
b) Em 1968 teve início uma luta contra todos os sistemas de pensamento, as assim ditas “grandes narrações”. (...) Não se aceita nenhum sistema que tenha a pretensão de ser “a verdade”. E isso investe contra os dogmas e o código moral da Igreja católica, e toda a sua pretensão de “magistério”. O Vaticano II não podia sequer imaginar tal situação. Não houvera nenhuma crítica de nenhum dogma e jamais fora posto em discussão seu inteiro sistema de pensamento. Ora, a nova geração contestava todo o sistema doutrinal da Igreja católica, porque tal sistema não permitia o livre exercício do pensamento. (...).
c) Simultaneamente, ocorreu a explosão da revolução feminista. A descoberta da pílula que permitia evitar a fecundação e, portanto, facilitava a limitação da natalidade provocou um entusiasmo universal entre as mulheres. (...) Os episcopados dos países socialmente desenvolvidos e os teólogos consultados pelo papa entendiam que não houvesse nada na moral cristã que pudesse condenar o uso da pílula. Mas, o papa se deixou impressionar pelo setor mais conservador, embora minoritário, e publicou a encíclica Humanae vitae. Foi como uma bomba. Houve imensa revolta entre as mulheres católicas, as quais não aplicaram a proibição papal e aprenderam a desobedecer. (...). Muitos bispos ficaram abalados, mas não podiam fazer nada porque o Concílio absolutamente não havia tocado a questão do exercício do primado do papa. O papa decide por si, também contra todos. Era este o caso: o papa havia decidido contra os bispos, os teólogos, o clero, os leigos informados. Desafortunadamente, isso foi obra de Paulo VI que, pelos muitos méritos havidos na história do Concílio, aparecia como homem de abertura. (...). Para muitos, a Humanae vitae era como um desmentido do Vaticano II: nada mudara!
d) Até então, o consumo tinha sido orientado pelos costumes. Havia um consumo moderado e limitado. O consumo dependia da regularidade da vida: refeições regulares e tradicionais, festas tradicionais com despesas tradicionais, segundo um ritmo de vida no qual o trabalho ocupava o lugar central. A partir dos anos 60, o trabalho deixa de ser o centro da vida. A partir de então, no centro está a procura do dinheiro para poder pagar as férias, os fins de semana, as festas que se multiplicam indefinidamente e o consumo festivo. O trabalho é o que permite o consumo. (...). As próprias estruturas sociais estimulam o consumo e todos os que não podem consumir se sentem rejeitados pela sociedade. (...)
e) (...) Uma nova moral avalia as pessoas com base no dinheiro acumulado e na ostentação de riqueza. A partir disso, os donos do capital fazem o que querem e como querem. Até a queda do comunismo na URSS, o magistério estava empenhado contra isso e dava pouca atenção ao crescimento rápido de uma nova forma de capitalismo. (...). Na prática, a Igreja se esquece da Gaudium et Spes e aceita a evolução incontrolada do capitalismo. A doutrina social da Igreja perde todo o significado profético porque não se aplica em nada a casos concretos. Na prática o magistério aceita o novo capitalismo. (...).
3. A reação da Igreja foi aquela que se podia temer
Os papas e muitos bispos aceitaram o argumento dos conservadores de que os problemas da Igreja derivavam do Vaticano II. Vários teólogos que haviam defendido e promovido os documentos conciliares mudaram de idéia e adotaram a tese dos conservadores, como o próprio papa atual. Diziam que o Concílio fora “mal interpretado”. Por isso, João Paulo II convocou um sínodo extraordinário em 1985, por ocasião dos 20 anos da conclusão do Concílio, para lutar contra as falsas interpretações e dar uma interpretação correta. Na prática, a nova interpretação, a “correta”, consistia em suprimir tudo aquilo que de novo havia nos documentos do Vaticano II. Um sinal fortemente simbólico foi a condenação da expressão “povo de Deus”. (...). Praticamente, aconteceu como após a Revolução francesa: fechar as portas e as janelas para cortar a comunicação com o mundo exterior e reforçar a disciplina para evitar fugas. Mas, em vão. O problema é que a Igreja já não tem mais uma imensa reserva de camponeses pobres. Na América Latina os pobres vão com os evangélicos.
Desde então, na linguagem oficial se faz referência ao Concílio, mas sua mensagem é ignorada. O Concílio permanece na memória e nos princípios das minorias sensíveis à evolução do mundo, que extrai dele argumentos para solicitar mudanças e respostas aos desafios do mundo atual. Os jovens, incluindo os novos sacerdotes, não sabem o que foi o Concílio, que não reveste para eles nenhum interesse. Estão mais interessados no catolicismo anterior ao Vaticano II, com suas seguranças, sua beleza litúrgica e a justificação de um autoritarismo clerical que os protege dos problemas.
A reação da Igreja tem sido aquele do retorno à disciplina precedente, cujo símbolo é dado pelo novo Código de direito canônico (...). O novo Código fecha as portas a todas as mudanças que poderiam inspirar-se no Vaticano II. Torna o Vaticano II historicamente inoperante.
No mundo, a prioridade dada à luta contra o comunismo – um comunismo já em plena decadência – induziu a Igreja a aceitar silenciosamente (os silêncios da Doutrina social da Igreja, dizia padre Calvez) o capitalismo desenfreado que emergiu nos anos 70. Na América Latina o Vaticano apoiou as ditaduras militares e condenou todos os movimentos de transformação social em nome da luta contra o comunismo. Desde a época do governo de Reagan, a aliança com os Estados Unidos permaneceu firme até a guerra contra o Iraque, que abriu por um momento os olhos do papa. De tal modo, a Igreja se aliava com os poderosos do mundo e se condenava a ignorar o mundo dos pobres em sua pastoral real.
Na América Latina a reação a Igreja à revolução cultural ocorrida no mundo desenvolvido foi muito dolorosa. Destruiu algo de novo que estava nascendo. Na América Latina, o Vaticano II significou uma mudança real. (...). O Celam, com a aprovação de Paulo VI, convocou a Assembléia de Medellín, a qual mudou a orientação da Igreja para que tirasse do Concílio conclusões práticas. Decidiu optar pelos pobres e empenhar-se por uma mudança social radical, legitimou as comunidades eclesiais de base e a formação dos leigos com base na Bíblia e na ação política. (...). Em várias regiões, Medellín não foi aceita nem aplicada. Mas, houve regiões importantes nas quais Medellín modificou a Igreja e se tornou a aplicação real do Vaticano II.
Tudo isso foi sistematicamente atacado em Roma com argumentos oferecidos por setores reacionários da América Latina. Desde 1972, a campanha contra a Conferência de Medellín foi dirigida por Alfonso López Trujillo. Malgrado isso, em Puebla, em 1979, Medellín se salvou. Mas, sob o pontificado de João Paulo II a pressão cresceu. Os argumentos romanos, as nomeações episcopais, a repressão contra os bispos mais empenhado0s na linha de Medellín tiveram efeito. A condenação da teologia da libertação em 1984 acabaria dando o golpe final. A carta do papa à Conferência episcopal brasileira do ano subsequente limitou um pouco o alcance da condenação, mas a teologia da libertação ainda representa hoje algo de suspeito.
4. O que resta do Vaticano II
Hoje, as reformas realizadas pelo Vaticano II nos parecem muito tímidas, totalmente inadequadas e insuficientes. Será preciso andar muito além, porque o mundo mudou mais nos últimos 50 anos do que nos 2.000 anos precedentes. Do Vaticano II devem permanecer, como base para as reformas futuras:
• O retorno à Bíblia como referência permanente da vida eclesial acima de todas as elaborações doutrinas ulteriores, dos dogmas e da teologia.
• A afirmação do povo de Deus como participante ativo na vida da Igreja, tanto no testemunho da fé como na organização da comunidade, com total definição jurídica dos direitos e dos instrumentos necessários no caso de opressão da parte da autoridade.
• A afirmação da Igreja dos pobres.
• A afirmação da Igreja como serviço ao mundo, fora de toda busca de poder.
• A afirmação de um ecumenismo de participação mais íntima entre as Igrejas cristãs.
• A afirmação do encontro entre todas as religiões e pensamentos não religiosos.
• Uma reforma litúrgica que use símbolos e palavras compreensíveis pelos homens e pelas mulheres contemporâneas. (...).
5. As condições da humanidade atual em estado de radical transformação.
a). Como entender a fé? A partir da modernidade, muitos cristãos perderam a fé ou pensaram tê-la perdido porque têm uma idéia errônea da fé. (...).
O objeto da fé é Jesus Cristo, a vida de Jesus Cristo. É dar a própria adesão a esta vida e adotá-la como norma, porque tem um valor absoluto, porque esta vida é a verdade, porque é assim que devemos ser homem ou mulher. Não é uma evidência que não permita dúvidas. É uma percepção de verdade que jamais suprime uma franja de dúvida, porque é sempre um ato voluntário e porque esta verdade não se vê. O crente não se sente obrigado a crer. É um ato de dom da própria vida, a escolha de um caminho. Não há evidência do fato de que Jesus vive e está conosco, porém sente-se sua presença como um apelo repetido, malgrado todas as dúvidas. (...).
Hoje o papa condena como relativismo fenômenos próprios do ser humano, que hoje não pode mais entender o modo tradicional de conhecer os objetos da religião. Estes não fazem parte de sua experiência de vida. (...). Tal condição do ser humano de hoje pressupõe uma profunda revisão da teologia da fé, a qual já está ocorrendo, mas não se divulga, com a conseqüência que milhões de adolescentes perdem sempre mais a fé, por não lhes ser explicado o que ela é.
b) A religião. Os nossos contemporâneos abandonam os atos litúrgicos oficiais da Igreja porque os consideram enfadonhos. A missa habitual é enfadonha, salvo em algumas circunstâncias especiais nas quais comparecem milhares de pessoas. (...) Quando a liturgia era um latim, era melhor porque não se entendia. Uma vez que se compreende, se capta seu estilo insuportável. É usada uma linguagem pomposa, formal, do tipo “humildemente pedimos”: ninguém fala assim. “Unimos as nossas vozes às dos anjos”: fórmula convencional que não responde a nada na vida. Há centenas de fórmulas semelhantes. (...).
c) A moral. Nossos contemporâneos não aceitam códigos morais, o fato que se lhes imponham ou se proíbam condutas porque estão no código. Eles querem entender o valor dos preceitos ou das proibições. Ou seja, estão descobrindo a consciência moral que permite captar o valor dos atos. (...). Antes a base da moral cristã era a obediência à autoridade. Era preciso fazê-lo ou não fazê-lo, porque a Igreja o ordenava ou proibia. Por isso tantas vezes os leigos perguntavam: isto se pode fazer? Se o sacerdote dizia que sim, o problema moral estava resolvido. Pois bem, isso pertence ao passado.
d) A comunidade. O cristianismo é comunitário. Mas, as formas tradicionais de comunidade tendem a debilitar-se. A própria família perdeu muito de sua importância porque os seus membros se encontram mais raramente. A paróquia atual perdeu o sentido de comunidade. Mas, estão aparecendo muitas novas formas de pequenas comunidades baseadas na livre escolha. Tais comunidades terão a capacidade de celebrar a eucaristia, o que pressupõe uma pessoa adaptada a presidi-la em cada grupo de umas cinqüenta pessoas. Não existe nenhuma dificuldade doutrinal para isso, porque nos primeiros séculos a situação era esta e não havia problemas. Isso é fundamental, porque uma comunidade que não se reúne na eucaristia não é realmente uma comunidade cristã. Os sacerdotes de tempo integral estarão em torno ao bispo de cada cidade importante para evangelizar todos os setores da sociedade urbana.
É claro que não sabemos quando e como se chegará a isso. É pouco provável que um Concílio que reúna unicamente bispos possa encontrar as respostas aos desafios da época. As respostas não virão da hierarquia, nem do clero, mas dos leigos que vivem o evangelho em meio a um mundo que compreendem. Por isso, devemos estimular a formação de grupos de leigos empenhados ao mesmo tempo com o evangelho e com a sociedade humana na qual atuam.
O Vaticano II permanecerá na história como uma tentativa de reformar a Igreja no final de uma época história de 15 séculos. Seu único defeito foi que chegou demasiado tarde. Três anos após sua conclusão, tinha início a maior revolução cultural do Ocidente. Os seus detratores o acusaram de todos os problemas que emergiram desta revolução cultural, e, com isso, o mataram. Mas, o Vaticano II permanece como um sinal profético. Em meio a uma Igreja prisioneira de um passado que não sabe superar, representa uma voz profética. Não conseguiu reformar a Igreja como teria desejado, mas foi um convite a olhar em frente. Ainda há potentes movimentos que pregam o retorno ao passado. Devemos protestar. Quando pessoas que nada entendem da evolução do mundo contemporâneo querem refugiar-se num passado sem abertura ao futuro, devemos denunciar. Para nós, o Vaticano II é Medellín. Também quiseram matar Medellín. Mas, Medellín permanece como a luz que nos mostra o caminho.
Uma última reflexão: O futuro da Igreja católica está nascendo na Ásia e na África. Será muito diverso. Aos jovens será preciso dizer: aprendei o chinês!
Para ler mais:
• Comblin: pedagogo, profeta e santo. Entrevista especial com D. Sebastião Soares e D. Luiz Cappio
• Os pobres e a libertação. Artigo inédito de José Comblin
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• Vaticano II e Zizola: uma resposta à convocação papal ao jornalismo
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• A liberdade cristã: um dos núcleos da teologia de José Comblin
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